LUCIENE ARAÚJO |
"Ainda pesquisando sobre a Igreja das Mercês, encontrei essa dissertação
muito interessante e esclarecedora, demonstrando que essas Igrejas, A
Igreja das Mercês, a do Rosário dos Pretos e a Mãe dos Homens, chamadas
de leigas, independentes e autônomas, de Irmandades negras e pardas
incomodavam sim e por essa razão foram demolidas quase na mesma época,
Em matéria sobre a Igreja do Rosário está afirmado que foi pago 80
contos de réis por essa demolição, desapropriação(?) que não foi paga a
Irmandade, mas, sim aos franciscanos que ficavam responsáveis pela
construção da nova Igreja que seria em Jaguaribe. A das Mercês queriam
construir lá em Tambauzinho, no meio do mato, a população e a Irmandade
se revoltaram e foi registrado na imprensa da época, exigindo que fosse
construída no centro, culminando por ser construída na Padre Meira.
“O CASO DAS MERCÊS”: analisando o
processo de demolição e desmonte das irmandades religiosas na cidade da
Parahyba (1923-1935) MENESES, Marcondes Silva (1); MOURA FILHA, MarIa
Berthilde (2) 1. Universidade Federal da Paraíba.
E-mail: marcondes_meneses@hotmail.com 2. Universidade Federal da Paraíba. E-mail: berthilde_ufpb@yahoo.com.br
RESUMO O presente artigo foi extraído de uma dissertação de mestrado em
fase defendida no Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo /
UFPB. Tem por problemática o processo de desmonte institucional e
físico das irmandades religiosas que existiam na Cidade da Parahyba
(atual João Pessoa/PB), no início do século XX, fato que incluiu a
demolição das igrejas pertencentes a estas irmandades. As igrejas das
irmandades de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, Nossa Senhora das
Mercês e Nossa Senhora Mãe dos Homens haviam sido edificadas entre
finais do século XVII e o século XVIII, quando tiveram importante papel
na assistência a seus membros, sendo suas igrejas marcos para definição
de novos espaços na malha urbana. Mas no início do século XX estas foram
demolidas, apontando a historiografia local se justificar tal fato como
parte das obras de urbanização e modernização da cidade. No entanto,
nossa pesquisa aponta para outra versão desta história, pois baseados em
documentos pesquisados nos arquivos históricos da Paraíba, se constata
que houve um interesse claro, consciente e planejado, por parte da
Igreja Católica, em contribuir no desmonte dessas instituições leigas,
autorizando a demolição das suas igrejas. Assim, conduzimos nossa
pesquisa tendo por hipótese haver uma convergência de interesses da
Igreja e do Estado que culminou com o desaparecimento das Irmandades na
Cidade da Parahyba. O recorte temporal do estudo foi definido pelas
datas de demolição das referidas igrejas, tendo por marco inicial 1923,
ano da demolição das Igrejas do Rosário e Mãe dos Homens, encerrando em
1935, quando desapareceu a igreja das Mercês. Aprofundamos a questão
analisando o mais emblemático destes processos de desmonte e demolição, o
qual foi noticiado pela imprensa local como “o caso das Mercês” que
ganhou evidência pelo embate entre os agentes envolvidos: a Diocese, a
irmandade e o pode municipal.
Palavras-chave: Arquitetura Religiosa; Irmandades; modernização urbana. 2 -
No final do século XVII e início do XVIII, na Cidade Parahyba, foram
erigidos templos pertencentes a irmandades religiosas, que cumpriram
papel relevante e ganharam evidência na paisagem e configuração urbana.
Entre estas casas religiosas três tiveram uma trajetória semelhante:
surgindo como referenciais para a organização da sociedade e para a
imagem da cidade do período colonial, acabaram tendo seus templos
demolidos nas primeiras décadas do século XX e, por este motivo,
tornaram-se o foco e o objeto de estudo do presente artigo. São elas: a
IGREJA DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO DOS PRETOS, que pertenceu a uma
irmandade de negros; a Igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens, edificada
por esta irmandade de homens pardos e cativos e a IGREJA DE NOSSA
SENHORA DAS MERCÊS, pertencente também a uma irmandade de pardos. Até
este momento, a desapropriação e demolição dessas igrejas eram
justificadas pelos pesquisadores como consequência do processo de
modernização da Cidade da Parahyba que ocorreu nas primeiras décadas do
século XX. Alguns dos autores que trabalharam sob esta ótica foram
Farias (1997), Terceiro Neto (1999), Vidal (2004), Chagas (2004), bem
como os historiadores, Aguiar (1993), Almeida (1997), Rodrigues (1994),
Pinto (1977), Barbosa (1994) e Silva (2009). Estes procuraram demonstrar
como o discurso e as intervenções realizadas pelo poder público,
fundamentados nas ideias de sanear, circular e embelezar as cidades,
apontavam para a necessária demolição das referidas igrejas de
irmandades, consideradas então como obstáculos para a construção de uma
cidade moderna. Conhecendo a contribuição que os referidos autores deram
para a história destes templos, mas percebendo ser possível acrescentar
novos dados sobre a mesma, em função da documentação revelada nos
arquivos pesquisados, o objetivo deste artigo é explorar outra face da
história da demolição dessas três igrejas de irmandades. A leitura e
análise dos documentos fizeram levantar a hipótese de que não foi só o
empenho do poder público em modernizar a cidade que motivou a demolição
das igrejas de irmandades. Havia também o interesse da Igreja Católica
na desapropriação desses templos, para cumprir a estratégia de desmonte
das irmandades religiosas, apontando para a convergência de interesses
entre o Estado e a Igreja visando o fim dessas instituições. Assim,
confirma-se ser o objetivo deste artigo analisar a convergência de
interesses da Igreja e do Estado para a demolição das igrejas vinculadas
às irmandades religiosas na Cidade da Parahyba, sendo nosso objeto
específico de estudo o denominado “Caso das Mercês”, forma como foi
tratada pela imprensa a demolição da igreja desta irmandade, em 1935.
Na pesquisa bibliográfica e revisão de literatura foram priorizados os
textos que ajudam a compreender a relação da Igreja com o Estado,
sobretudo com a Proclamação da República quando o catolicismo perdeu a
primazia de ser a religião oficial do Brasil.
Neste sentido foram
importantes as obras de Hoornaert (1994), Hoornaert (1983), Holanda
(1960) e Santos (2010). A pesquisa documental definiu a abordagem
adotada para análise do objeto de estudo.
O Arquivo Eclesiástico da
Paraíba foi o principal acervo documental pesquisado, revelando
documentos oficiais e periódicos de época que balizaram o novo olhar
sobre a demolição das igrejas das irmandades. Destaca-se o documento
publicado por Dom Adauto, em 1895, intitulado Regulamento e Prescrições,
o qual possibilitou perceber qual era o projeto da hierarquia, naquele
momento, em relação às irmandades. Definidos o objeto de estudo, a
hipótese levantada e o objetivo, o presente artigo foi sistematizado em
três itens que serão apresentados a seguir. Ao fim, esperamos ver
cumpridos os objetivos propostos e, principalmente, ter dado uma
contribuição para este campo de estudo, abrindo perspectivas para
futuras investigações que aprofundem e consolidem esta nova visão sobre o
desaparecimento de diversas igrejas das irmandades de leigos, fato que
não foi exclusivo à Cidade da Parahyba.
1 ROMANIZAÇÃO DA IGREJA
BRASILEIRA A relação da Igreja com o poder temporal, no Brasil, nem
sempre foi harmoniosa. Desde os primórdios da colonização, a Igreja se
empenhou em garantir espaço nas novas terras descobertas por Portugal,
já que na Europa vinha perdendo fiéis por causa da Reforma Protestante.
No entanto, se deparava com uma intromissão do poder real nos assuntos
eclesiásticos, tendo como base jurídica o direito de Padroado concedido
aos reis pelos papas. Santos (2010, p. 27), tendo por base o trabalho de
Thales de Azevedo (1978) sobre a Igreja Católica na Bahia, destacou as
tensões da Igreja e do Estado na referida arquidiocese. O autor defende
que ambos, na concepção de complementaridade, passariam por uma “crise
de identificação” chegando a confundir-se institucional e juridicamente,
gerando choques por divergirem em relação ao uso da justiça e no
tocante à jurisdição de cada um, bem como nos aspectos hierárquicos.
Constata-se que, ao longo do período colonial brasileiro, se
multiplicaram as contendas entre estas duas instituições. No Império, as
tensões culminaram com a chamada “Questão 4 ”, que teve origem quando
Dom Frei Vital, obedecendo a uma ordem do Papa, mandou expulsar das
Irmandades Religiosas da sua diocese as pessoas que eram adeptas da
maçonaria. Estas, por sua vez, usaram o direito civil em seu favor,
recorrendo ao Imperador para não cumprir a ordem dada pelo epíscopo. O
Governo deu ganho de causa às Irmandades, mas Dom Vital se recusou a
cumprir a ordem, tendo sua prisão decretada pelo governo Imperial.
Instaurou-se, portanto, uma crise que ultrapassou a ação de um bispo,
pois os outros se manifestam a favor de Dom Vital. Monte Junior (1874.
p. 62) registra que Dom Macedo Costa, bispo do Pará, escreveu ofício ao
ministro do Império dizendo: “Se o bispo de Pernambuco é réu perante a
lei, Exmo. Senhor, réus perante a lei sou eu e muitos outros bispos do
Império” (FRAGOSO, 1980. p. 186). Com a chegada da República e a
inserção do Brasil no processo de modernização (COSTA, 1998), tanto a
Igreja como o Estado tiveram por princípio a reafirmação da autonomia
das duas instituições. Ao mesmo tempo, o interesse da Igreja era
conservar sua credibilidade, adotando estratégias para manter-se
presente na sociedade e para assegurar seu poder diante do novo governo
que se instaurava. Neste período, a Igreja Católica se deparou com o
divórcio de uma união de quatro séculos, sendo o Decreto 119-A, o
documento oficial que pôs fim a este casamento, proibindo a
interferência da autoridade Federal e dos Estados em matéria de ordem
religiosa, consagrando a liberdade plena de expressão de fé e cultos,
colocando um fim no consórcio do padroado. (...)Como resultado, muitas
cidades são modernizadas e atendem à condição de ícone do lema de “Ordem
e Progresso” adotado pela República. A Igreja, por sua vez, sem o aval
do poder secular, teve que responder a questões profundas de natureza
essencial para a sua atuação na sociedade. Dias (2008) apresenta algumas
indagações pertinentes à atuação da Igreja devido à Proclamação da
República: Qual o lugar social da Igreja no novo regime? Qual a
identidade institucional que o catolicismo separado do Estado assumiria?
E, que meios ou instrumentos a Igreja utilizaria (ou criaria) para
manter sua influência sobre a população brasileira na nova conjuntura?
(DIAS, 2008, p.64) 5 A partir de então, a Igreja assume uma atitude mais
voltada para seu interior, no sentido de romanizar as suas estruturas.
Aquelas ideias norteadoras apontadas pelos bispos reformadores do
segundo império foram então colocadas em prática.(...)" "
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