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Todo dia 06 de janeiro é costume de italianos e
alguns descendentes comemorarem o dia da Befana. Aqui na Paraíba, em João
Pessoa, desde 2001, no mês de dezembro, antes do recesso, comemoramos La Befana
no Centro Cultural Ítalo-Brasileiro Dante Alighieri, que carinhosamente também
chamamos de comunidade italiana na Paraíba. Segundo o folclore italiano, a
Befana é uma mulher idosa, cuja aparência se assemelha a de uma bruxa bondosa,
que na madrugada do Dia de Reis, vem depositar nas meias das crianças italianas
doces ou carvões dependendo do comportamento que estas tiveram no ano anterior.
Se a criança se portou bem recebe doces, se portou-se mal recebe carvões.
Obviamente, os pais que enchem as meias de seus filhos fazem uma mescla de
doces e carvões. Não sei se atualmente as crianças penduram suas meias nas
lareiras, onde costumavam os antigos cultuar o fogo sagrado em honra às deusas
Vesta e Juno, deusas protetoras do lar, do casamento e da família. De qualquer
forma, chegou até mim a informação por parte de minha avó materna, que na
aldeia dela lá na Itália, as crianças camponesas tinham verdadeira veneração
por La Befana. Relatava minha nonna que meu bisavô costumava encher
as meias de suas filhas e do seu único filho homem [i]
, Francesco[ii],
com nozes e claro, um carvãozinho. La
Befana é muito mais que folclore ou uma bruxa que vem punir crianças mal
comportadas. La Befana simboliza a própria lei do carma, do retorno, que vem
gratificar aqueles que são merecedores e convidar à mudança aqueles que se
encontram ainda aprendendo. Essa benevolência, apesar de ser ela aquela que vem
para apontar e convidar à autocrítica deve-se ao fato da figura da Befana
encontrar sua origem ainda no período Mesolítico/Neolítico ter sido prestigiada
como deusas mães, fecundas e provedoras. La Befana representa a ancestralidade
e por isso, porta o carvão para a sua descendência. Segundo o Dicionário de Símbolos
de Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, o carvão encerra em si todo um conjunto
de potencialidades e uma vez aceso ocorre uma alquimia em que essas
potencialidades seriam ativadas e desenvolvidas. La Befana vem mostrar, em seu
sentido espiritual, ancestral, toda a potencialidade que possui aquele que
recebe um carvão, como exortação para que se aprimore enquanto indivíduo. Os
doces e carvões encontrados em meias penduradas sobre a lareira, segundo o
Dicionário de Bruxaria Hereditária remeteria ao simbolismo do fuso, haja vista
a confecção da meia ou de qualquer outra bolsa que possa ser posta para a
passagem da Befana. Em alguns relatos as crianças também deixariam em troca um
prato de comida para a Befana. Há uma troca clara de energia o que é comum nas
religiões que se utilizam de alimentos como ofertas para as divindades. O fuso,
ainda segundo o Dicionário de Símbolos, simbolizaria o próprio ciclo lunar, a confecção
da própria vida a partir dos mistérios lunares, enquanto a lareira simbolizaria
o aspecto masculino, solar. Portanto, La Befana sempre remeterá à vida na harmonização
de todos os seus opostos e expansão de nossas potencialidades. Representa a
continuidade das gerações e a necessidade de nos aprimorarmos para podermos
manter a unidade na nossa convivência familiar em benefício da nossa própria
sobrevivência. Ocorre que nossa Befana foi tratada de forma desrespeitosa com o
advento do Cristianismo. La Befana é de origem pagã, antiga, ancestral,
neolítica. Sua origem se confunde no tempo com o culto do Deus Fauno. Com o
Cristianismo e com o protagonismo de figuras masculinas, La Befana foi “condenada”
a viver como uma bruxa desesperada e errante, dando voltas no globo terrestre,
porque teria se recusado a seguir os Três Reis Magos até a manjedoura do Menino
Jesus. Na verdade, ela que na sua origem simboliza a própria necessidade de
evolução de cada ser humano e a gratidão aos antepassados tornou-se uma figura
rebelde que vaga sem direção, arrependida, e desesperada para conseguir
enxergar a luz trazida pelo Menino Jesus. Realmente, La Befana não poderia ter
sido tratada de outra forma pela nossa cultura patriarcal. Porém, fica aqui meu
registro e gratidão a todas as mulheres da minha família que vieram antes de
mim e com seus exemplos puderam construir a mulher que sou. Gratidão a todas e
todos que vieram antes e com os ensinamentos repassados de geração em geração
foram capazes de manter sua descendência em que pesem sacrifícios pessoais e
colheita dura. Aos meus que morreram nas guerras ou pelas tristezas causadas por
elas, minha eterna gratidão.
Laura Berquó
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