domingo, 15 de novembro de 2015

TRABALHO APRESENTADO NO CONPEDI EM BELO HORIZONTE: sem o resumo e o abstract

O PRINCÍPIO DA BUSCA DO PLENO EMPREGO À LUZ DA ORDEM ECONÔMICA DE 1988: a valorização dos fatores mão-de-obra e empresariedade


1. INTRODUÇÃO

O presente artigo corresponde ao primeiro capítulo da dissertação de mestrado defendida em 05 de abril de 2006, no Programa de Pós – Graduação em Direito da UFPB, intitulada “O Princípio da Eficiência na Busca do Pleno Emprego”, sendo que o referido capítulo intitulado “O Princípio da Busca do Pleno Emprego” foi readaptado para atender aos novos acontecimentos econômicos e políticas desenvolvimentistas adotadas pelo atual Governo do PT, a partir da criação do PAC e de expansão de políticas sociais desmercantilizadoras em detrimento de uma verdadeira promoção dos fatores mão-de-obra e empresariedade, em conformidade do que preconiza atualmente o princípio da busca do pleno emprego. A pesquisa é basicamente qualitativa com base em fonte bibliográfica.  
A doutrina jureconomista pouco fala sobre o conceito de pleno emprego, pois o limitam ao emprego da mão-de-obra. Apesar da ênfase dada não só pelos juristas, mas também por economistas, em direcioná-lo para o emprego da mão-de-obra, o pleno emprego não pode ser alcançado ignorando os demais fatores de produção da economia, que são no total cinco fatores: mão-de-obra e empresariedade (fatores humanos), capital, tecnologia e recursos naturais.
                        Todos devem ser harmonizados entre si, isto porque a capacidade empresarial é o fator responsável pela mobilização dos demais fatores de produção e o fator recursos naturais para ser considerado um fator de produção depende do fator tecnologia, em virtude de que a falta de acesso a um recurso natural por ausência de tecnologia específica, essa potencialidade não será considerada fator recurso natural. O pleno emprego ocorre justamente quando toda a potencialidade de um país é empregada, sendo esta expressa pelo estoque de fatores de produção.
                        Ocorre que em determinado momento, algum fator de produção será prestigiado, sem excluir os demais. Na Ordem Econômica de 1967/1969 o fator capital que se traduzia na infra-estrutura econômica, por exemplo, era o fator prestigiado naquele período. Já a Ordem Econômica de 1988 prestigia os fatores mão-de-obra e empresariedade, conforme se infere da leitura dos artigos 1º, IV e 170, caput do Estatuto Básico de 1988.
                        O desafio atual, em virtude da necessidade de se respeitar e atender aos fundamentos do Estado brasileiro que se traduzem também na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, é o de não promover políticas públicas de natureza recessiva que não preservem postos de trabalho bem como não incentive a oportunidade de expansão e sobrevivência das empresas, em especial da empresa nacional de pequeno porte, conforme inteligência do art.170, IX da Constituição Federal de 1988.
                       

2. O PLENO EMPREGO E A ORDEM ECONÔMICA BRASILEIRA

                       
Em 09 de julho de 1964, a Organização Internacional do Trabalho realizou a Convenção Política de Emprego n.º 122. No Brasil, a Convenção foi ratificada pelo Decreto Legislativo n.º 61, de 30 de novembro de 1966 e promulgada em 24 de março de 1969. Entretanto, a Constituição de 1967, inicialmente, não inseriu em seu texto o princípio da busca do pleno emprego, tal como se encontra na Constituição Federal de 1988. Outro documento legal dos anos de 1960 que registra a expressão pleno emprego é o Estatuto da Terra em seu artigo 1º, § 2º condicionando a política agrícola ao atendimento do pleno emprego.
                        Somente com a Emenda Constitucional n.º 01/69 é que a busca do pleno emprego, na condição de princípio constitucional, foi trazido a lume pela Ordem Econômica brasileira, não com a nomenclatura hoje conhecida, mas como expansão das oportunidades de emprego produtivo. O art. 157 da Constituição Federal de 1967, antes da EC n.º 01/69, trazia como um de seus princípios a harmonia e a solidariedade entre os fatores de produção, mas não a expressão expansão ou busca do pleno emprego dos fatores de produção. Ainda, na Carta de 1937, o artigo 135 também utilizou a expressão fatores de produção, quando tratava da intervenção do Estado no domínio econômico para coordená-los. Infere-se que o conceito de fatores de produção já era conhecido nos textos constitucionais, antes do acréscimo da expressão expansão com a EC n.º 01/69 e busca do pleno emprego da Carta atual.  
                        A partir da Constituição Federal de 1988, o princípio da expansão das oportunidades de emprego produtivo passou a se chamar princípio da busca do pleno emprego. Os princípios da Ordem Econômica de 1988 visam à promoção da existência digna dos cidadãos, como ditames da Justiça Social tendo como fundamento a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa.
                        Tal distinção é necessária para a qualificação do princípio em questão. Os princípios declinados no artigo 170 da Constituição Federal de 1988 são em sua natureza princípios constitucionais impositivos, impondo ao gestor público o dever de aplicá-los para alcance dos objetivos idealizados pelo legislador constituinte. Nesse diapasão, trata-se das normas – tarefa de Gomes Canotilho (GRAU: 1997, PP. 262-263), normas cogentes que forçam o Poder Público a aplicar políticas que atendam a determinado fim, podendo ser suscitada a inconstitucionalidade de atos contrários.
                        Infere-se que a resposta à adoção de políticas públicas de caráter recessivo será a inconstitucionalidade dos atos que provoquem esse resultado. Entretanto, a Ordem Econômica não está fundada somente na valorização do trabalho humano, mas também na livre iniciativa. A valorização do trabalho humano e a livre iniciativa são o alicerce da Ordem Econômica brasileira, logo, dois fatores de produção são prestigiados sem desconsiderar os demais: o fator mão-de-obra e empresariedade.
                        A Ordem Econômica de 1967/1969 tinha como fundamento o desenvolvimento nacional e a justiça social. A valorização do trabalho humano e a expansão das oportunidades emprego produtivo, dentre outros, eram princípios que viabilizariam os dois princípios que fundamentam a Ordem Econômica e Social, após a Emenda Constitucional n.º 01/1969. Antes da Emenda Constitucional n.º 01/1969, o fundamento da Ordem Econômica de 1967 era somente a Justiça Social.
                        Uma das propostas da Carta de 1967/1969 era a realização da Justiça Social através da Ordem Econômica, esta vinculada aos princípios de justiça distributiva. Conforme ensinamentos de Modesto Carvalhosa, a justiça distributiva seria a tradução, no plano econômico, da justiça social (1972, p.p. 59-61). Ressalte-se ainda que o entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a Emenda Constitucional n.º 01 de 17 de outubro de 1969, outorgada pelos Ministros da Guerra, da Marinha e Aeronáutica, é na verdade uma outra Constituição, haja vista que determinou inclusive quais dispositivos da Constituição Federal de 1967 estavam revogados e quais ainda vigorariam, tratando-se não de um caso sui generis de processo constituinte mas de mais uma Constituição outorgada, a exemplo da Constituição Imperial de 1824 e a Constituição Federal de 1937.
                        Apesar da Ordem Econômica de 1967 e 1969 ter como um de seus fundamentos a justiça social, o que se viu no início dos anos de 1970, principalmente após o dito Milagre Econômico foi a maior concentração de renda da história econômica do país. A valorização do trabalho humano e a livre iniciativa eram princípios da Ordem Econômica de 1967 e não fundamento da mesma, não havendo primazia desses fatores sobre os demais fatores de produção.       
                        A Ordem Econômica de 1969 tinha como fundamento o desenvolvimento nacional. Este precedia, no caput do artigo 160 da Constituição Federal de 1969 (conforme o entendimento do STF e não simples Emenda à Constituição) o princípio da justiça social. É de suma importância observar a ordem desses princípios. A justiça social estava atrelada ao desenvolvimento nacional, devendo este ser alcançado primeiro. A justiça social seria a conseqüência do desenvolvimento econômico, o que parece óbvio. Porém, infere-se que não existia a primazia do fator trabalho. Todos os fatores de produção deveriam ser mobilizados para o alcance do desenvolvimento nacional e posterior promoção da justiça distributiva.
                        Eros Roberto Grau (1997, p. 263) afirma que o princípio da busca do pleno emprego, constante do Estatuto Básico de 1988, assegura indiretamente o fator trabalho. Sua justificativa é que o princípio referido não inclui somente o fator mão-de-obra, mas também os demais fatores de produção. Na verdade, era a Ordem Econômica e Social de 1967 e de 1969 que assegurava indiretamente o pleno emprego do fator trabalho como conseqüência da mobilização dos demais fatores de produção.
                        Apesar do princípio da expansão das oportunidades de emprego produtivo ter sido interpretado pela maioria de seu tempo como garantidor do pleno emprego da mão-de-obra, a valorização do trabalho humano não era o fundamento da Ordem Econômica anterior, mas um de seus instrumentos. Já a Ordem Econômica de 1988 prestigia diretamente o fator mão-de-obra ao trazer como um de seus fundamentos a valorização do trabalho humano.
                        A Constituição Federal de 1967 (antes da Emenda Constitucional n.º 01/1969) tinha como princípio a harmonia e solidariedade entre os fatores de produção, apesar de trazer também os princípios da liberdade de iniciativa e a valorização do trabalho humano. A Ordem Econômica de 1967 era uma ordem econômica indefinida, que não expressava claramente a ideologia adotada, os mecanismos de realização desses princípios, tendo sido enunciados sem conexão com o resto do texto constitucional (CÔRREA: 1969, p. 80). Os parágrafos seguintes do artigo 157 estavam conexos apenas com o princípio da função social da propriedade e repressão ao abuso do poder econômico.
                        Segundo Themistocles Cavalcanti, ao tratar das formas de intervenção econômica do Estado, previstas na redação original da Carta de 1967, afirma que a livre empresa e a gestão direta pelo Estado, como suplementar à atividade privada, com base no artigo 157, I, e artigo 163, eram os instrumentos principais para o alcance da justiça social (1969, p. 164).
                        A partir da Emenda Constitucional n.º 01/1969, a interpretação correta dada ao princípio da expansão de emprego produtivo, não seria o de tomá-lo exclusivamente como pleno emprego do fator trabalho. Essa confusão é mais aceitável com relação à Ordem econômica de 1988, justamente porque a valorização do trabalho humano é um de seus fundamentos ao lado da livre iniciativa.
                        Na verdade, o fator de produção prestigiado nos anos de 1960 foi o fator capital. Trata-se do capital internacional das multinacionais, pois a partir do governo de Juscelino Kubistschek de Oliveira, a economia brasileira sofreu um processo de desnacionalização. Após a Segunda Grande Guerra Mundial, os EUA precisaram investir o capital que foi acumulado. Assim, as multinacionais são criadas entre as décadas de 1940-1960 (SANTOS, 2000, p. 26).


3 . DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS RECESSIVAS


Na busca pelo pleno emprego dos recursos de produção, em especial do fator mão-de-obra e empresariedade, considerando o disposto no artigo 1º, IV e artigo 170, caput, da Constituição Federal, podem as políticas públicas de caráter recessivo ser consideradas inconstitucionais?
O princípio da busca do pleno emprego pode ser classificado, segundo a tipologia apresentada por Canotilho como principio constitucional impositivo, impondo ao legislador “a realização de fins e a execução de tarefas. São, portanto, princípios dinâmicos, prospectivamente orientados” (CANOTILHO: 1998, p. 1040)
Em face do princípio em tela, reclama-se por políticas públicas para a sua promoção. Ressalte-se que o alcance da proposta estabelecida pelos princípios da Ordem Econômica tem como objetivo viabilizar os fundamentos desta (valorização do trabalho humano e livre iniciativa) e alcançar o os seus fins propostos (assegurar a todos existência digna) em conformidade com os ditames da justiça social. Portanto, os princípios elencados no artigo 170 do Estatuto Básico de 1988 são princípios constitucionais impositivos.
As políticas públicas recessivas afetam a possibilidade de se alcançar o pleno emprego. Nesse contexto tornasse difícil garantir a todos existência digna e atender e a justiça social, esta entendida como justiça distributiva (CARVALHOSA: 1972, p. 59).  Concorda-se, portanto, com Eros Roberto Grau quando da possibilidade de se reconhecer a inconstitucionalidade de políticas públicas recessivas, decorrente do caráter impositivo do princípio da busca do pleno emprego, e não somente do seu caráter conformador, pois são princípios constitucionais impositivos que reclamam políticas para sua implementação, conforme classifica Grau.
Os princípios constitucionais conformadores refletem a ‘ideologia inspiradora da constituição’ (CANOTILHO: 1998, p. 1039). Eros Roberto Grau refere-se ao caráter conformador do princípio por ser a CF/88 uma Constituição Dirigente, refletindo a ideologia de um Estado Social por meio de suas normas programáticas.
As ações político-econômicas devem sempre respeitar a Constituição. Não importa os interesses dos grupos econômicos, mas o gestor que cuida da implantação das políticas públicas, e demais elaboradores, deve, antes de tudo, cuidar do bem comum que também poderá apresentar um conceito histórico, variável, como também por exemplo, o conceito de interesse público, conforme se verifica a partir dos modelos de gestão do Estado advindos com as várias Reformas Administrativas. Os princípios, sejam eles constitucionais ou não, são normas jurídicas, e como tais são expressões de um dever-ser.
A atividade econômica reveste-se de um valor de conduta, de um dever-ser econômico. Não deve o Poder Público conceber o processo produtivo como um fenômeno mecânico (CARVALHOSA: 1972, p. 60). O descumprimento das normas jurídicas gera um clima de incerteza na sociedade, comprometendo a segurança que é o fim imediato do Direito, sendo condição necessária para a realização da justiça (NÓBREGA: 1975, pp. 73-74).
A não observância das normas constitucionais gera insegurança porque a realidade imposta não condiz com os fins almejados pelo constituinte, representante da sociedade. O princípio jurídico é espécie de norma jurídica, não havendo como ‘se negar ao princípio constitucional a sua natureza de norma, de lei, de preceito jurídico, ainda que com características estruturais e fundamentais bem diferentes de outras normas jurídicas, com as regras de direito’ (ESPÍNDOLA: 2002, p. 80).
O princípio constitucional da busca do pleno emprego, pelo seu caráter impositivo, de reclamar por políticas públicas para sua efetivação, torna inconstitucionais as políticas públicas de natureza recessiva. Apesar do princípio da busca do pleno emprego possuir natureza de norma programática, sendo um dos instrumentos para alcance do fim proposto pelo art. 170 da Constituição Federal de 1988, a sua violação importa em inconstitucionalidade. Nesse caso, qualquer lei que atente contra qualquer princípio da Ordem Econômica deve ser declarada inconstitucional (SILVA: 2001, p. 166).

4. DAS POLÍTICAS DESMERCANTILIZADORAS E O PRINCÍPIO DA BUSCA DO PLENO EMPREGO

Numa época em que existem políticas sociais de redistribuição de renda para a população carente brasileira, como ficaria a análise do Princípio da Busca do Pleno Emprego mediante a adoção do Princípio da Desmercantilização das referidas políticas com recorte social?
O conceito de políticas públicas desmercantilizadoras segue o entendimento criado por Gosta Esping-Andersen
“Seguindo a linha de Marx e Polany, Esping-Andersen (1990) inovou ao formular uma concepção mais ampla e "generosa" de se analisar as políticas sociais, isto é, concebê-las e estudá-las à luz das possibilidades de desmercantilização (decommodification)5 das relações sociais. Em outros termos, isso implica analisar as políticas sociais tendo como referência o grau de autonomia e independência que essas políticas conseguem garantir aos indivíduos e (ou) famílias de sobreviverem para além das relações do mercado. Conforme esse autor, uma definição mínima da concepção de desmercantilização deve incorporar a possibilidade de cada cidadão em decidir e (ou) optar livremente por não trabalhar quando assim considerar ou julgar necessário, podendo e tendo como sobreviver dignamente para além da participação no mercado (Esping-Andersen, 1990, p.23). Outrossim, desmercantilização refere-se ao grau em que indivíduos podem manter um nível de vida tolerável, independentemente da obrigação de participarem no mercado de trabalho. As políticas sociais devem, portanto, ser concebidas pelos Estados de Bem-Estar, que regulam a oferta e a demanda de trabalho. Para Merrien (2002), esses Estados podem ser classificados em fortes, médios ou fracos quanto à possibilidade de oferecerem legalmente aos indivíduos oportunidade de saírem mais ou menos fortes em relação ao mercado. Em virtude disso, Draibe e Riesco (2006) qualificam a concepção de desmercantilização como uma característica inovadora do direito social de cidadania”. (Zimmermann e Silva: 2009)
O Princípio da Desmercantilização já é adotado em políticas sociais como o Bolsa Família, em que pese a exigência de contrapartida, como matrícula de filhos em idade escolar e assiduidade escolar, bem como vacinação das mesmas, ressaltando que tais contrapartidas não são de cunho "mercantilizadoras", apesar da educação ser sempre direcionada para o futuro mercado de trabalho, ou ainda, "favor do Estado" para os mais pobres, que acabam por atender ao mercado somente num ponto: a necessidade de pessoas que não possuem uma boa formação para aceitarem os trabalhos mais mal pagos e mais humildes na escala social. A educação obrigatória ocuparia o horário das crianças em risco social, sobretudo daquelas que estudam em escolas públicas que aderiram ao Mais Educação.
O Bolsa Família fortalece o/a cidadão/ã que poderá impor um preço mais digno pelo seu trabalho e não se submeter à exploração daqueles que usufruem do seu trabalho, sobretudo nas relações de trabalhos domésticos e rurais, subvertendo a lógica do pleno emprego desenvolvido pelos economistas clássicos de que a procura pelo serviço para ganhar a vida, faria com que a economia operasse sempre em pleno emprego, uma vez que os salários seriam ditados pelos proprietários dos meios de produção e assim haveria emprego nas condições estabelecidas pelos empregadores.
O Princípio da Desmercantilização não se aplica a todas as políticas públicas, mas no caso específico das políticas sociais que são políticas públicas com recorte residual, seletivo, para um público em situação de pobreza ou de risco social. Assim, o Princípio da Desmercantilização equilibraria a ação do mercado sobre a vida das pessoas, nos seus direitos sociais. Acabaria por viabilizar o Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Diferentemente da corrente liberal em defesa da mercantilização do trabalho, o Princípio da Desmercantilização ajuda através de políticas que diminuem a miséria, uma vez que provoca ainda que pequena, uma redistribuição de renda, denominada de justiça distribuitiva. Forçar ao trabalho pessoas sem o mínimo social é forçá-las a entrar no mercado de trabalho sem poder de barganha, submetê-las ao arbítrio do mercado, aliená-las haja vista que as mesmas não se identificariam enquanto pessoas com vontade própria a um trabalho que melhor expressasse a sua verdadeira vocação, ajudando ainda a concentrar a riqueza na mão de poucos.
Por isso, o Princípio da Desmercantilização das políticas sociais colabora também com o Princípio da Dignidade Humana e com o fundamento constitucional da valorização do trabalho humano e incita o Estado a criar postos e novas condições de trabalho que atendam o Princípio da Busca do Pleno Emprego sem ferir os fundamentos da República Federativa do Brasil e da Ordem Econômica de 1988.

5. ATUAL CENÁRIO: o Programa de Aceleração do Crescimento e o retorno ao desenvolvimentismo e os índices de desemprego no Brasil

O Princípio da Busca do Pleno Emprego denominado pela Ordem Econômica de 1969 nasce na verdade com a denominação princípio de expansão das oportunidades de emprego produtivo como visto. E também como já ressaltado a sua primeira aparição na legislação pátria ocorre com o advento do Estatuto da Terra.
Na verdade, o Princípio da Busca do Pleno Emprego já nasce com seu viés desenvolvimentista, prestigiando o fator capital. Para compreender esse quadro, deve-se reportar ao período do Governo Juscelino Kubistsckek.
A partir de 1956, Juscelino Kubstschek de Oliveira, ao assumir a Presidência da República, buscou descentralizar e modernizar a Administração Pública, criando o que foi denominado Administração Paralela. Assim foi possível executar o Plano de Metas que tinha como um de seus princípios a eficiência. Adotava, assim como no Regime Militar o viés desenvolvimentista, e assim como ocorreu no período do Milagre Econômico verifica-se o acesso a recursos externos, alto endividamento público, com crescimento de mais de 300%.
Na época do Milagre Econômico (1968-1973) as taxas de juros do mercado internacional eram baixas, mas após 1973 e 1979 com as crises mundiais do Petróleo o Estado Brasileiro apresentou uma situação de insolvência perante os seus compromissos financeiros externos. Mas nem isso foi suficiente para que após a gestão de Costa e Silva (período do Milagre Econômico), o presidente Geisel que assumiu a Presidência do país entre 1974 a 1979, foi capaz de reduzir o volume de investimentos e gastos públicos, o que mais tarde no período de do governo de João Figueiredo resultou em elevados índices de inflação, em desemprego, baixo crescimento do PIB, insatisfação dos movimentos de trabalhadores, sociais e de massa. Então, apesar de ter ocorrido a expansão do fator capital através de uma infra-estrutura econômica não antes vista, o Regime Militar deixou como herança um passivo só equacionado a partir da criação do Plano Real no Governo Itamar Franco.
Mas durante o Regime de Ditadura Militar é que se verifica realmente a adoção de metas desenvolvimentistas atreladas aos interesses do capital externo, que refletiu na promulgação de legislações que assegurassem as aspirações desenvolvimentistas. As principais ações do governo Castello Branco (15.04.1964 a 15.03.1967) na área da reforma macroeconômica e de estruturação financeira nacional foram: o ajuste das contas públicas, o controle da inflação (orientação monetarista), criação do Plano de Ação Econômica do Governo (PLAEG). A equipe formada pelos Ministros Octavio Bulhões (Fazenda) e Roberto Campos (Planejamento) culpava o excesso do déficit público e os reajustes salariais como responsáveis pelo aumento dos preços. 
Houve no governo de Castello Branco medidas como: a criação do FGTS (terminava a estabilidade nos empregos); a unificação da Previdência (o que ajudava a custear obras públicas); criação do ICM, do ISS e do IPI; pagamento de tributos por rede bancária; criação do Fundo de Participação de Estados e Municípios. É bom ressaltar que nesse período em cumprimento com as exigências assumidas pelo Brasil pela assinatura da Carta de Punta D’Este e sua adesão ao Programa Aliança Para o Progresso o Brasil cumpriu com a promessa de criar e alterar para se adequar as exigências norte-americanas as legislações agrária, tributária, financeira e bancária. Na área agrária temos o Estatuto da Terra de 1964, modelo capitalista de produção agrícola e primeiro documento legal a utilizar a expressão “pleno emprego”; na área tributária temos a criação dos tributos apontados  e do Código Tributário Nacional; na área financeira e bancária temos a legislação de 1964 que criou: bancos comerciais, bancos de investimentos, o Sistema Financeiro da Habitação, o Sistema Financeiro Nacional e o Banco Central do Brasil.
           
No atual modelo de Estado dito Societal inaugurado com o Governo do PT em 2003, vê-se um retorno ao modelo desenvolvimentista com pouca ênfase na expansão e promoção dos fatores mão-de-obra e empresariedade, mas sim do fator capital como visto nos idos dos anos 1950-1960. Desde o ano de 2007, com a criação do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, para o triênio 2007-2010 e com a criação da segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento II – PAC II, instituído em 2010 para o triênio 2011-2014, questiona-se se não está havendo um retorno ao modelo desenvolvimentista de Estado próprio da Reforma Administrativa de 1967, com a expansão do fator de produção capital.
                        Qual o programa de grande visibilidade do governo federal para geração de emprego e renda? Existem na verdade programas pontuais de geração de emprego e renda, sem maiores divulgações, a exemplo do Plano Nacional de Emprego e Trabalho Decente (criado em 2010 pelo Ministério do Trabalho e Emprego, com o objetivo de combater a pobreza e as desigualdades sociais), em conformidade com as Convenções n.º 100 e 111 da OIT, ratificadas pelo Congresso Nacional brasileiro, dentre outros mais antigos (PRONAF, PRONAGER, etc).
Em que pese a expansão do setor econômico, necessariamente não significa que o problema do desemprego no país, bem como os problemas dos pequenos empresários, que são os maiores geradores de emprego, sejam resolvidos. O que se percebe é que existe maior interesse em se pautar as políticas públicas de maior visibilidade na expansão do fator capital, ainda que com programas esparsos e pontuais de geração de emprego e renda. Em compensação tem-se outro Programa Nacional de grande visibilidade e sucesso que é justamente um programa de políticas sociais desmercantilizadoras (como já exposto) para famílias de baixa renda, como o Bolsa Família. Portanto, programas assistencialistas e de crescimento do fator capital têm sido o carro-chefe da propaganda governamental, o que não debela o desemprego, apesar de causar determinado alívio às camadas mais desfavorecidas da população brasileira.
                        Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, divulgados pela imprensa em 31.01.2013, informam que o desemprego do mês de dezembro de 2012, apresentou o seu menor nível histórico, caindo para uma taxa de 4,6%, quando a taxa do mês de novembro de 2012, apresentou uma taxa de 4,9%. Ocorre que segundo o jornalista Rodrigo Viga Gayer da agência de notícias Reuters Brasil, a expectativa de redução da taxa de desemprego, segundo a média das previsões seria de uma taxa de 4,4% (Reuters Brasil, 2013). Se compararmos com países como Espanha e Portugal que passam por grave recessão e aumento das taxas de desemprego, o nível de desemprego nesses países apresentou taxas históricas de 21,3% (2011) e 16,3% (2012), o que realmente pode fazer acreditar que o Brasil não se encontra em recessão e que as taxas apresentadas não são tão altas assim.
                        Mas ao analisar a taxa real de desemprego do Brasil em outubro de 2012, quando a taxa informada tinha sido de, 5,3% para o mês de outubro de 2012, 4,9% para o mês de novembro (IBGE), 4,4% para o mês de dezembro de 2012 (IBGE), a taxa real de desemprego, segundo o DIEESE, foi de 21,4% para o mês de outubro de 2012, verificando-se que não houve realmente uma política eficaz de combate ao desemprego (DIEESE, 2012).
                        O ideal seria que os programas de crescimento econômico pudessem se harmonizar com os vários programas pontuais de geração de emprego e renda, ou então criar um Programa da grandeza do PAC voltado para a geração de emprego e renda associado com o próprio PAC (no caso, nas suas próximas fases, já que o PAC 2 tem término previsto para 2014).
                       

5. CONCLUSÃO


                        A busca do pleno emprego dos fatores de produção da economia é uma imposição para observância dos fundamentos constitucionais dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa que conduzem o espírito socioeconômico da Carta Magna de 1988.
                        O modelo econômico hegemônico imposto através do processo de globalização contraria o princípio da busca do pleno emprego, destacando-se o fator mão-obra e empresariedade (pequenas empresas, por exemplo), conforme se verifica a partir da crise econômica pela qual passa atualmente a maior parte dos países europeus. Portanto, questiona-se com base no ordenamento constitucional brasileiro, podem as políticas econômicas de caráter recessivo ser evitadas, caso se priorizasse o Dever-Ser, expresso através das normas jurídicas, em especial dos princípios constitucionais?
                        Até que ponto as questões econômicas andam de mãos desatadas com o Direito, sobrepondo o Ser, criado e fomentado por interesses de um modelo hegemônico em detrimento do Dever-Ser? São questionamentos que interessam ao estudioso do Direito Econômico e Constitucional porque não haverá como se alcançar a Justiça Social e demais fundamentos e objetivos erigidos pela Constituição caso o Direito seja enfraquecido perante os ditames da Economia, que na maioria dos casos oferece insegurança a toda ordem jurídica estabelecida. 
                        Ainda, no momento atual, verifica-se uma prioridade do Estado brasileiro na expansão da infra-estrutura econômica através da criação do Programa de Aceleração do Crescimento nas suas duas fases (triênio 2007-2010 e 2011-2014), o que caracterizaria em si, uma priorização do fator de produção capital. Apesar da harmonização que deve acontecer na expansão dos fatores de produção da economia, não se vislumbra, por exemplo, um Programa Nacional para expansão do emprego da mão-de-obra e das empresas nacionais de pequeno porte na mesma grandeza do PAC-PAC 2. Por isso, há o receio que o fator de produção capital esteja sendo priorizado em detrimento dos fatores mão-de-obra e empresariedade, que pela Ordem Constitucional atual deveriam ser priorizados.
As políticas sociais desmercantilizadoras, ainda que possam trazer benefícios à população economicamente ativa de baixa renda aumentando o seu poder de barganha, torna-se ao lado do programa desenvolvimentista PAC um dos carros-chefe do atual modelo de Governo inaugurado em 2003 (apesar de políticas sociais desmercantilizadoras terem surgido em número maior no Governo FHC), não atinge obviamente o preconizado pelo princípio da busca do pleno emprego, mas gera uma conformidade enquanto este não é devidamente implementado por meio de políticas públicas que promovam em especial os fatores mão-de-obra e empresariedade.

REFERÊNCIAS:

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_____. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967.
_____. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967/1969.
_____. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
_____. Estatuto da Terra. Lei n.º 4.504, de 30 de novembro de 1964.  
_____. Ministério do Planejamento. Programa de Aceleração do Crescimento – PAC 2. In:http://www.pac.gov.br/sobre-o-pac/divulgacao-do-balanco/balanco-completo. Acesso em 28 de janeiro de 2013.
_____. Ministério do Trabalho e Emprego. Plano Nacional de Emprego e Trabalho Decente. In: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/decent_work/doc/pnetd_534.pdf. (site da Organização Internacional do Trabalho no Brasil). Acesso em 28.01.2013.
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