domingo, 11 de março de 2018

ENTREVISTA COM MINHA MÃE DE SANTO PARA O SITE DO PLANALTO

Imagem Victor Moura

PREZAD@S, MINHA MÃE DE SANTO, DONÉ MÃE RENILDA DE OXÓSSI, DEU ENTREVISTA EM BRASÍLIA PARA O SITE DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA EM 08.03.2018 (www4.planalto.gov.br/consea). MÃE RENILDA AGORA SE CHAMA MÃE RENILDA BEZERRA ALBUQUERQUE E NÃO MENEZES COMO CONSTA NA ENTREVISTA. É A PRIMEIRA IALORIXÁ A INCLUIR O NOME MÃE. MULHER DE LUTAS E DE VÁRIAS BANDEIRAS, CONHEÇAM MAIS UM POUCO SOBRE ESSA PARAIBANA QUE MUITO NOS TEM ORGULHADO.

 "Por ser negra e de terreiro, era a ‘desgraça da família’; hoje dizem que sou o orgulho"



Mãe Renilda: “Neste 8 de março, quero dizer a todas as mulheres da Paraíba, do Consea, do Brasil e até do mundo que é importante estarmos juntas nessa luta. Queremos sempre ter um homem ao nosso lado, mas nunca nós atrás do homem”. 
Mãe Renilda Bezerra de Menezes é o nome dela. É nome mesmo, não apelido, já que essa paraibana, radialista há 40 anos, conquistou o direito de ser chamada assim oficialmente, por meio de uma sentença judicial. “Sou a primeira mulher a ter esse direito no Brasil. E não exclusivamente porque sou Mãe de Santo. Estou abrindo um caminho para outras pessoas como eu.  E o meu recado para as mulheres neste dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, é esse: façam como eu, insistam, persistam, não desistam da resistência, somos mulheres somos guerreiras”.
Segundo ela, a violência “feminicida” é ainda maior quando se trata de mulheres negras. “Principalmente quando essa mulher é negra e de terreiro. É uma violência diferenciada, não apenas na sociedade. Mas também na sua casa, quando seu companheiro ou companheira não aceita que ela tenha a liberdade de professar sua religião”, conta.
Cheia de energia e animação, a presidenta do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da Paraíba (Consea-PB) manda seu recado às mulheres: “No dia de hoje, quero dizer a todas as mulheres da Paraíba, do Consea, do Brasil e até do mundo que é importante estarmos juntas nessa luta. Queremos sempre ter um homem ao nosso lado, mas nunca nós atrás do homem”.
Ela concedeu nesta quinta-feira a seguinte entrevista ao site do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), do qual faz parte.
Pesquisa recente, realizada pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Institute for Advanced Study in Toulouse e Instituto Maria da Penha, apontouSalvador como a cidade do Nordeste onde a mulher mais sofre violência doméstica física, seguida de Natal e Fortaleza. Como está a situação na Paraíba?
Percebo que a situação na Paraíba não é diferente. Nessa semana passada mesmo houve um feminicídio bárbaro no estado, em que o assassino chegou a avisar nas mídias sociais que iria mata-la. ‘Vou te assassinar, vagabunda’, ele disse. A moça foi à Delegacia das Mulheres fazer a denúncia e, mesmo assim, foi assassinada no mesmo dia, com 40 peixeiradas [faca longa e afiada usada para limpar peixes]. É uma violência horrorosa, extrema, cruel por parte de homens que ainda pensam que são donos da gente. Quando, na verdade, somos todos iguais. É preciso que estejamos mais unidas contra isso.
Estudo do IBGE divulgado nesta 4ª feira (7/3) mostra que, apesar de mais escolarizadas, mulheres recebem, em média, apenas 75% do valor pago aos homens. No Nordeste também é assim?
Nem me diga. Eu que sou da área de comunicação, como radialista, sempre ganhei menos que os homens que trabalhavam na mesma função que eu. Eu fazia, como faço ainda hoje na Rádio Tabajara, o Programa Afro-Brasil (que agora pode ser ouvido pela internet) e sempre vi os colegas profissionais homens ganharam mais. Na comunicação o que se vê é homens galgando caros de chefia, ganhando dinheiro, ficando bem de vida e nós, parece que somos invisíveis. Tem de saber apresentar um programa três vezes melhor para podermos ser consideradas boas profissionais. Aliás, na Paraíba, o mesmo vale para a Educação e a Saúde. Apesar de eu ressalvar que o atual governo do estado tem dado mais espaço para as mulheres, inclusive de cargos de comando das principais secretarias.
Como se deu, na sua vida, a conscientização de que estava em uma posição vulnerável, como negra e mulher?
A minha descoberta desses aspectos foi muito interessante, porque comecei a frequentar religiões de matriz africana com nove anos de idade. E aí já comecei a ser discriminada justamente na minha família. E por me assumir como negra, meu próprio pai dizia a minha mãe: “Veja, Maria, que desgraça sua filha arrumou pra nossa vida. Além de ser mulher, agora inventou de ser negra. Anda com uma ‘ruma’ [bando] de viado e sapatão e ainda é ‘cabimbozeira’. Isso somente na família. E eu não era convidada para as festas de aniversário. Diziam assim, “ah, Reni, não precisa nem você ir”. Eu sabia que era para ninguém ver que eles tinham uma filha com tantos “atributos” negativos.
Como a senhora lidou com essa situação?
Eu fui para a resistência, para o Movimento Negro. Resisti até hoje e atualmente todos da família me admira. É interessantíssimo. Gente importante, como o governador do estado, anda muito junto comigo, porque somos amigos desde que éramos estudantes. E então hoje sou uma mulher com visibilidade, apareço na televisão. E todos da família me querem perto. Hoje eu sou o orgulho da família. E é por isso que eu digo para as mulheres fazerem como eu fiz: insistir, persistir e nunca desistir. Somos mulheres, somos guerreiras.
(Entrevista: Ivana Diniz Machado)"

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