sábado, 28 de junho de 2025

TORTURAS NA PENITENCIÁRIA FEMININA MARIA JÚLIA MARANHÃO - PARTE 1

 

Foto: Andréa Giselle Cartaz feito por mim em 2013


PREZAD@S, COMEÇANDO O PRIMEIRO POST ONDE COLOCO POSTAGENS DESDE 2015 DO BLOG SOBRE FATOS OCORRIDOS EM 2013. PARA FACILITAR A PESQUISA. TRATA DA TORTURA DE PRESAS NO INFERNO BOM PASTOR, OFICIALMENTE CHAMADO PENITENCIÁRIA FEMININA MARIA JÚLIA MARANHÃO. NAS PRÓXIMAS POSTAGENS IREI POSTAR DURANTE A SEMANA AS PETIÇÕES QUE FORAM FEITAS ÀS AUTORIDADES ESTADUAIS, VEP, PROMOTORIA (VEP), MINISTROS, SEM NENHUM RETORNO E ABAFAMENTO DO CASO. TAMBÉM VOU POSTAR AS PERSEGUIÇÕES PROMOVIDAS PELO GOVERNO DO ESTADO POR MEIO DA CORREGEDORIA DA PGE-PB. 

POR QUE INSISTO? PORQUE ISSO É IMORAL E ILEGAL. VIOLÊNCIA DE GÊNERO CONTRA MULHERES EM VÁRIOS NÍVEIS. TORTURAR É A DECADÊNCIA DO SER HUMANO. AS PRESAS NÃO DEIXARAM DE SER MULHERES. SEGUEM AS CARTAS QUE NÃO FORAM CONSIDERADAS POR AUTORIDADES, PORQUE FORAM ESCRITAS POR PRESAS. PRESAS NÃO TÊM "LUGAR DE FALA" APÓS O ETIQUETAMENTO? QUAL O MANDA-CHUVA POR TRÁS DA SEAP? POR QUE GOVERNADORES NADA FIZERAM PARA COIBIR ESSE TIPO DE COISA? HÁ MUITO MATERIAL INCLUSIVE PARA PESQUISA ACADÊMICA COMO JÁ FOI FEITA.


CORDIALMENTE,


LAURA


http://epahey2015.blogspot.com/2015/06/iii-coepir-e-mocao-de-repudio-torturas.html

 http://epahey2015.blogspot.com/2015/06/cartas-das-apenadas-do-bom-pastor-2013.html

 http://epahey2015.blogspot.com/2015/07/cartas-da-apenadas-do-bom-pastor-parte.html

 http://epahey2015.blogspot.com/2015/07/incoerencias-de-uma-sindicancia-fajuta.html

 http://epahey2015.blogspot.com/2015/07/c-caso-celebre-de-racismo-institucional.html

PARECER IAB: CRIMINALIZAÇÃO DA INTERSEXOFOBIA




PREZAD@S, PARECER DE MINHA AUTORIA APROVADA PELA COMISSÃO DE DIREITO CONSTITUCIONAL DO INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS. PUBLICADO NO BLOG EM REFERÊNCIA AO DIA INTERNACIONAL DO ORGULHO LGBT.
SEGUE O PARECER ABAIXO:



Indicação nº 08/2025
Projeto de Lei nº 2.921, de 17 de julho de 2024.
Cuida da criminalização da intersexofobia no Brasil.
Indicação proposta pela Confreira Dra Marcia Dinis


EMENTA: PROJETO DE LEI Nº 2.921/2024. INDICAÇÃO ORIGINÁRIA COMISSÃO DE CRIMINOLOGIA DO IAB. CRIMINALIZAÇÃO DA INTERSEXOFOBIA. MANDADO DE INJUNÇÃO 4733-DF. ADO 28-DF. DIREITOS FUNDAMENTAIS. RACISMO SOCIAL.


1. RELATÓRIO
A Comissão de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros foi provocada para emissão de parecer sobre o Projeto de Lei nº 2.921, de 17 de julho de 2024 de autoria do Deputado Federal Clodoaldo Magalhães pelo Partido Verde - Pernambuco , conforme indicação originária da Comissão de Criminologia, tendo como confreira indicante a Dra Marcia Dinis.
Cuida a Indicação nº 08/2025 de análise legal do Projeto de Lei nº 2.921/2024 que “dispõe sobre a criminalização da intersexofobia e dá outras providências”.Segundo a douta indicante, Dra Marcia Diniz, o referido Projeto de Lei se encontra ainda em fase de indicação de relator na Comissão de Saúde (CSAÚDE) da Câmara dos Deputados Federais.
Analisando o Projeto de Lei nº 2.921, de 17 de julho de 2024, observa-se que o legislador proponente se preocupou com a criminalização da intersexofobia não só no que tange aos crimes de discriminação e preconceito, equiparados pelo STF (ADO 26-DF e MI 4733-DF) desde 13.06.2019 ao crime de racismo até que sobrevenha lei para suprir a lacuna legislativa. Mas conferiu um espectro mais específico ao tratar da violência hospitalar contra pessoas intersexo, senão vejamos:
“O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Fica instituída a criminalização da intersexofobia em todo o território nacional.
Art. 2º Define-se como intersexofobia qualquer ato de discriminação, violência, preconceito ou pressão contra pessoas intersexo, bem como seus familiares, em função de suas características sexuais, anatômicas e/ou genéticas.
Art. 3º Constitui crime de intersexofobia em ambiente hospitalar:
I. Qualquer tentativa de persuadir, pressionar, coagir ou forçar crianças intersexo, seus familiares ou responsáveis a submeterem-se a cirurgias estéticas nos genitais, no sistema reprodutor ou a procedimentos de hormonização com o objetivo de enquadramento a um gênero binário, sem o consentimento livre, prévio e esclarecido do próprio indivíduo intersexo;
II. Praticar atos de violência física, psicológica, simbólica ou moral contra pessoas intersexo e seus familiares em razão de suas características sexuais;
III. Promover, incitar, difundir ou apoiar atos de preconceito ou discriminação contra pessoas intersexo, em qualquer meio ou circunstância, dentro do ambiente hospitalar.
Art. 4º A pena para os crimes definidos no Art. 3º desta Lei será de:
I. Reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos e multa, se o crime não constituir outro mais grave;
II. Reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa, se houver emprego de violência física ou psicológica;
III. Reclusão de 3 (três) a 6 (seis) anos e multa, se o crime for cometido por agente público ou no exercício de profissão ou cargo público.
Art. 5º O Estado, por meio de seus órgãos competentes, deverá promover campanhas educativas e de conscientização sobre a diversidade intersexo, buscando a erradicação do preconceito e a promoção da igualdade de direitos.
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
Nesse mesmo diapasão seguiu o entendimento da Confreira Dra Marcia Dinis para justificar a sua indicação, conforme a seguir, coadunando com a justificativa apresentada no PL nº 2.921, de 17 de julho de 2024:
“A intersexofobia é uma realidade enfrentada por milhares de pessoas que muitas das vezes nem sabem que são pessoas nascidas intersexo no Brasil. Durante décadas, bebês nascidos no sexo intersexo foram submetidos a cirurgias não consentidas (mutilações) e expostos a situações degradantes (hormonioterapia forçada e/ou obstáculos fabricados para impedir as pessoas nascidas intersexo de conseguirem efetivar o acesso ao direito de saúde (qualidade de vida). A ausência de proteção legal de bebês, crianças, adolescentes e pessoas adultas e idosas nascidas intersexo no território brasileiro tem permitido a perpetuação dessas violações de Direitos Humanos. O PL preenche uma lacuna jurídica essencial, garantindo proteção específica aos bebês, crianças, adolescentes e pessoas adultas e idosas nascidas intersexo. O PL se alinha a tratados internacionais de Direitos Humanos e visa impedir práticas médicas abusivas, assegurando o direito à autonomia corporal, direito de saúde, equidade e dignidade humana. O PL também prevê que o Estado Brasileiro, por meio de seus órgãos competentes, deverá promover campanhas educativas e de conscientização sobre a diversidade e pluralidade existencial das pessoas nascidas no sexo intersexo, de corporeidade fenotípica e/ou genotípica, buscando a erradicação do preconceito, do crime de intersexofobia e a promoção da equidade de direitos. O PL representa um marco legal na defesa, garantia, promoção e efetivação do bem comum das pessoas nascidas intersexo e seus familiares e um direito legislado visando a erradicação de práticas discriminatórias e abusivas no Brasil.”
Em razão do exposto, a indicante pugna para que a Casa de Montezuma se pronuncie acerca de tema tão relevante e que exige o enfrentamento por meio de políticas públicas para a garantia dos direitos fundamentais das pessoas intersexo:
“O debate acerca das politicas públicas sobre o tema e, em especial, sobre a criminalização da intersexofobia dentro de hospitais, é um avanço importante e necessário, mas infelizmente pouco suscitado até agora nas instituições acadêmicas e jurídicas. O IAB, instituição jurídica que tem como lema estar na vanguarda do direito e o dever estatutário de promover a defesa “das garantias individuais e coletivas e dos direitos humanos” (art. 2º, IV) não pode ficar alheio a tema desta importância.”
É o Relatório, passo a opinar.

2. FUNDAMENTAÇÃO
Com fincas nos artigo 3º, II do Estatuto do Instituto dos Advogados Brasileiros, artigo 69 do Regimento Interno da Casa de Montezuma, bem como da Resolução 03/2018, passo a discorrer sobre a fundamentação jurídica que embasará a conclusão do presente parecer.
Inicialmente, é interessante que se registre que ao pesquisar sobre intersexualidade a relatora do Parecer se deparou com a pouca atenção que se é dado ao tema, uma vez que na atualidade se discute mais a transgeneridade e a utilização da teminologia trans* (com asterisco) para designar de forma geral como termo “guarda – chuva” pessoas não-binárias, transmaculinas, mulheres trans e travestis, conforme conceituação contida na Cartilha O Ministério Público e os Direitos LGBT do Ministério Público Federal conjuntamente com o Ministério Público do Estado do Ceará .
Com a mesma carência nos deparamos ao analisarmos autores consagrados de sexologia no Brasil, que embora tratem desde o século XX de assuntos como transexualidade (transexualismo em manuais antigos por tratarem como parafilia e não como identidade de gênero), travestilidade (travestismo em manuais antigos por tratarem como parafilia e não como identidade de gênero), homossexualidade (homossexualismo em manuais antigos por tratarem como parafilia e não como orientação sexual), não dão a devida atenção ou nenhuma à pessoa intersexo.
Provavelmente, essa ausência, a forma como a pessoa intersexo é invisibilizada se deva mais a uma projeção coletiva inconsciente do medo da unidade ou totalidade representado pelo “andrógino”:
“O andrógino, signo da totalidade, aparece tanto no final e no começo dos tempos. Na visão escatológica da salvação, o ser reintegra-se a uma plenitude na qual a separação dos sexos se anula, e isso é o que evoca o mistério do casamento em inúmeros textos tradicionais, aproximando-se assim à imagem de Xiva e de sua Xácti. Todavia, essa crença universalmente afirmada na unidade original a que o homem deve se reintegrar post mortem está acompanhada também, na maioria dos temas cosmogônicos de uma necessidade imperiosa de diferenciar totalmente os sexos nesse mundo.” (Cheebrand: 1991)
Ainda, sobre o andrógino como símbolo psíquico da totalidade, podemos citar Mircea Elíade ao tratar do tema ao citar a literatura védica na obra Mefistófeles e o Andrógino:
“Os esforços feitos pelo homem para superar os contrários levam-no a sair de sua situação imediata e pessoal e a alçar-se a uma perspectiva transubjetiva; em outros termos, a atingir o conhecimento metafísico. Na sua experiência imediata, o homem é constituído por pares de contrários. Mais ainda: ele não só distingue o agradável do desagradável, o prazer da dor, a amizade da inimizade, como igualmente é levado a crer que esses opostos são também válidos no absoluto; em outras palavras, que a realidade última é passível de definição pelos mesmos pares de opostos que caracterizam a realidade imediata na qual o homem se encontra imerso pelo simples fato de viver no Mundo. Os mitos, os ritos e as especulações hindus abalam essa tendência humana a considerar a experiência imediata do Mundo um conhecimento metafisicamente válido que reflete, poder-se-ia dizer, a realidade última. Superar os contrários é, sabe-se, um leitmotiv da espiritualidade hindu. Pela reflexão filosófica e pela contemplação — como ensina o Vedanta — ou por técnicas psicofisiológicas e meditações — como recomenda a Ioga — chega-se a transcender as oposições e até a realizar a coincidentia oppositorum no próprio corpo e no próprio espírito.” (ELIADE: 1999)
  Ora, não há como realmente se entender a pouca visibilidade dada às pessoas intersexo e as violências por elas sofridas, tendo sido muito acertada, portanto, a referida indicação acerca do Projeto de Lei que será analisado. As pessoas têm o direito de existirem na sua plenitude, incluindo a forma como decidem se expressar corporalmente no mundo o que tem relação com o direito congênito à autodeterminação de identidade de gênero e/ou orientação sexual
Demanda-se, portanto, iniciar o parecer com a conceituação de pessoa intersexo. A Associação Brasileira de Intersexos nos traz o conceito de pessoa intersexo:
“Uma definição objetiva de Intersexo, feita pela Intersex Human Rights, sitiada na Austrália, define as pessoas Intersexo como as que têm características sexuais congênitas, não se enquadrando nas normas médicas e sociais para corpos femininos ou masculinos, e que criam riscos ou experiências de estigma, discriminação, ódio e danos. Essa definição é compartilhada pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. A declaração baseia-se em uma definição de características sexuais. Baseada nos Princípios de Yogyakarta mais 10, definem-se as características sexuais como sendo características físicas relacionadas ao sexo, incluindo cromossomos, órgãos genitais, gônadas, hormônios e outras anatomias reprodutivas, e características secundárias que aparecem na puberdade.”
Os Princípios de Yogyakarta Mais 10 (YP+10) são na verdade a inclusão de mais 10 “princípios” ao texto originário de 2006 que previa inicialmente 29 “princípios” que na verdade, têm a natureza de soft law. Citando nosso entendimento já exposado no Parecer em resposta à Indicação de nº 23/2024, proferido pela Comissão de Direitos Humanos acerca da Resolução Conjunta CNPCP/CNLGBTQIA+ nª 02, de 26 de março de 2024, os Princípios de Yogyakarta não possuem força coercitiva para aplicação, devendo nos concentrar, portanto, a outros instrumentos jurídicos que possam abarcar os direitos das pessoas intersexo no presente parecer:
“(...) a adoção de soft law não estaria nem adstrita à colmatação de normas jurídicas, pois não há nelas sequer natureza de costume internacional. Ainda que se alegue que são meramente recomendatórias, como visto as normas técnicas e as soft law também não possuem força coercitiva em caso de inobservância. O que de fato tem garantido a sua aplicabilidade é que elas não confrontam a legislação pátria e muitas das previsões dessas regras gerais se encontram em vigor no ordenamento jurídico brasileiro por meio dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos citados nas Considerações da Resolução Conjunta, bem como por direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988. Ademais, os Princípios de Yogyakarta, embora seja na verdade um instrumento internacional de “boas intenções”, não pode sustentar a natureza de princípios jurídicos.” (BERQUÓ, 2024)
Ainda sobre a falta de natureza como princípios jurídicos dos chamados Princípios de Yogyakarta, não somente pela natureza de soft law, mas pela inexistência realmente de embasamento deontológico que os caracterizem como princípios, citamos a lição de Lenio Streck sobre pamprincipiologia:
“O Direito foi inundado por uma produção de standards valorativos, álibis teóricos pelos quais se pode dizer qualquer coisa sobre interpretação da lei. Um princípio – sem qualquer densidade deontológica – tem a “força” de derrotar o Direito posto, sem que o intérprete lance mão da jusrisdicação constitucional. A esse fenômeno dei o nome, desde 2004, depois de um debate com o professor Luis Roberto Barroso sobre o princípio da afetividade, de pamprincipiologismo, havendo uma longa lista de “pamprincípios” em Verdade e consenso (2014b; 2017) (...) O estado de arte do quadro principiológico se torna ainda mais complexo e problemático quando se constata que se está diante de um conjunto de “princípios” dos quais é difícil – para não dizer impossível – reconhecer o DNA em tempos de pós – positivismo (não positivismo) e da busca da autonomia do Direito. Em muitos casos, chega a ser impossível identificar o status dos aludidos “princípios”, isto é, se está diante de princípio constitucional, infraconstitucional ou de um enunciado no nível dos velhos “princípios gerais do Direito” . (2020; pp. 253-255)
Qual a legislação aplicável atualmente na proteção das pessoas intersexo? Mister abordar o MI 4733-DF e a ADO 26-DF. Desde 13.06.2019 a intersexofobia, assim como a homotransfobia, passou a ser tida como forma de racismo na sua extensa dimensão social, segundo entendimento do STF e por essa razão iremos tratar das legislações atinentes à questão racial no Brasil, atualmente aplicáveis no combate aos crimes homotransfóbicos até que lei específica supra a omissão legislativa.
A Constituição Federal de 1988, ineditamente na história constitucional do país, criminalizou o racismo, no artigo 5º, XLII, na condição de crime imprescritível e inafiançável. A década de 1980 durante todo o processo da Constituinte foi grande na participação de movimentos sociais negros, feministas e de povos originários. Não pode ser desprezado que o Brasil é signatário de vários tratados internacionais anteriores à própria Carta de 1988 que tratam da questão racial como, por exemplo a Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial de 1966, ratificada pelo Congresso Nacional pelo Decreto Legislativo nº 23, de 21 de junho de 1967 e que passou a vigorar a partir do Decreto nº 65.810, de 08 de dezembro de 1969.
 Recentemente, com status de Emenda Constitucional temos a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância de 2013 (Guatemala) em vigor desde a publicação do Decreto nº 10.932, de 10 de janeiro de 2022. Quanto aos demais instrumentos legais internacionais vigoram no Brasil: o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966, em vigor com a publicação do Decreto nº 592, de 06 de julho de 1992, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, em vigor com a publicação do Decreto nº 591, de 06 de julho de 1992; a Convenção de Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) de 1969, em vigor com a publicação do Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992 e o Protocolo de São Salvador de 1988, em vigor com a publicação do Decreto nº 3.321, de 30 de dezembro de 1999.
No que tange à aplicação da Lei Caó o que se pode ser dito é que a Lei n.º 7.716, de 05 de janeiro de 1989, que define os crimes de racismo e que assim foi nomeada em homenagem às iniciais do nome de seu autor, o Deputado Federal Carlos Alberto de Oliveira (Caó), tinha como pretensão definir os crimes de preconceito de raça e cor. Na justificativa do projeto de lei, o deputado aduz que o Brasil é um país racista e por isso a pessoa negra não consegue ter acesso à vida econômica e política do país.
A Lei Caó original, antes das alterações, somente tratava de crimes resultantes de preconceito de raça e cor. Tratava originalmente mais dos aspectos econômicos e sociais de acesso ao trabalho e ao consumo. No art. 3º, por exemplo, verificava-se a preocupação com o racismo institucional na não-ascensão a cargos da Administração Pública em geral e empresas concessionárias. Outros aspectos que preocuparam inicialmente o legislador: a) Coibir o impedimento do acesso ao lazer em virtude da discriminação; b). coibir o impedimento do acesso a estabelecimentos recreativos, a estabelecimentos estéticos; c) Coibir o impedimento do acesso às entradas sociais dos prédios e edifícios. Era a liberdade de ir e vir que estava sendo focada. Também visava coibir a discriminação dentro das Forças Armadas, vida e convívio familiar em razão da raça, cor e etnia.
    Após entrar em vigor, passou por diversas alterações, como a ocorrida primeiramente com a Lei n.º 8.081, de 21 de setembro de 1990, incluindo o elemento religioso: o art. 20, originalmente tratava somente das condutas tipificadas como “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, religião, etnia de procedência nacional através dos meios de comunicação, até que veio as alterações da lei n.º 8.882/1994 que incluiu o parágrafo primeiro.
Isso é um breve resumo da razão pela qual a Lei Caó foi criada, mas há questões técnicas que devem ser enfrentadas extremamente relevantes por serem extremamento relevantes e para não correrem o risco de tornarem o entendimento do Constituinte prejudicado em embates que possam ocorrer, como já ocorridos no Caso Ellwanger e que alcançam atualmente os crimes considerados homotransfóbicos.
Importante salientar que a falta de uma técnica legislativa adequada abre espaços para discussões acerca da prática de racismo e discriminação, haja vista que a própria Constituição Federal sem definir o que é racismo, assim como a lei ordinária não o faz, também não o fez com o crime de discriminação. O problema está no fato de que imprescritível seria o crime de racismo e não o de discriminação conforme teses levantadas durante a década de 2000 e amplamente aceita de forma minoritária inclusive por alguns Ministros do STF. Como pode o legislador não se ocupar em distinguir bem os tipos racismo e discriminação já que um não prescreve e outro prescreveria segundo entendimento aceito até princípio do século XXI para alguns Ministros do STF?
Em que pese a Lei Caó tipificar condutas como racismo e discriminação, deixou margem para que racistas alegassem estar “discriminando” e não cometendo “racismo” para poderem ser beneficiados pela extinção da ´punibilidade em decorrência do alcance da prescrição. Assim pode ser verificado a utilização dessa tese de “crime de discriminação” e a alegada possivel extinção da punibilidade pelo alcance da prescrição tanto no célebre Caso Ellwanger (HC 82424-RS), como também no HC 117.097-RJ.
Coube a juristas como Silvio de Almeida e Adilson Moreira fazerem a distinção entre racismo e discriminação, inclusive contextualizar para que não fosse utilizado como ferramenta de opressão contra a população racializada, haja vista que a lei se destina na verdade a proteger a parcela da população vítima de racismo estrutural no Brasil, estendendo a outros grupos historicamente marginalizados, que no caso em tela, podemos estender às pessoas intersexo. Nesse entendimento seguiu o Ministro Edson Fachin do Supremo Tribunal Federal ao proferir voto na condição de Relator no HC 154.248-DF ao confirmar mais uma vez o entendimento do Superior Tribunal de Justiça que o crime de injúria racial é imprescritível por ser espécie do qual o crime de racismo é gênero. Nesse entendimento, o crime de discriminação seria também espécie do crime do racismo afastando a prescrição que serviu como tese no Caso Ellwanger tendo sido condenado o antissionista e antissemita Elwanger Castan por 8x3 no STF por racismo e não por discriminação, por terem entendido a maioria dos Ministros, contrariando o entendimento do Relator Moreira Alves, que os judeus também foram racializados, porque o conceito de raça é uma construção política-ideológica utilizada por um grupo hegemônico para subjugar outro como foi o caso dos nazistas contra os judeus no holocausto durante a Segunda Grande Guerra Mundial fazendo surgir o conceito de genocídio por Rafael Lemkin. Assim expressa o jurista Silvio de Almeida ao distinguir preconceito, discriminação e racismo na sua obra Racismo Estutural. (2019, pp.22-24)
Mas seria imprescindível que o legislador ao tratar de tipificar condutas não deixasse tão em aberto a possibilidade de que conceitos importantes fossem sempre definidos pelos não-legisladores. Corre-se o risco de estarmos diante da ideia da legislação simbólica citando aqui a inteligência de Marcelo Neves “a legislação simbólica é caracterizada por ser normativamente ineficaz” (2018, p. 51).
Infere-se que como racismo é uma forma sistemática de discriminação, que inclusive leva ao racismo estrutural, no caso da discriminação racial, eram equivocadas as teses que buscavam separar os crimes de racismo e discriminação para que no caso de um suposto crime de “discriminação” pudesse operar a “prescrição”. O preconceito enquanto ideia que pode não ser não exteriorizada pode ser que nunca venha se manifestar no mundo dos fatos e ter repercussão para o Direito. No momento em que se exterioriza e se torna prática, torna-se tipo punível para a Lei 7.716/89. Na mesma esteira pode-se citar o entendimento do também jurista Adilson Moreira sobre o conceito de discriminação e o dano causado ao bem jurídico que visa a ser tutelado pelo Direito, como exposto na obra Racismo Recreativo (2019, pp. 43-44) , a partir de estigmas que são formados pelo preconceito que levam à discriminação e ao racismo.
Logo, não há como não concluir que a discriminação também é espécie do gênero racismo, bem como o preconceito uma vez externado, porque o preconceito embora possa se caracterizar por ideias construídas muitas ao longo do tempo como afirma Silvio de Almeida ao citar exemplos associados a certos estereótipos em específico que estão no imaginário popular, dependendo da carga pejorativa, levam à discriminação e ao racismo. Logo, são imprescritíveis.
Voltando ao PL em análise, o legislador propõe a tipificação a partir da conduta de discriminar pessoas intersexo no artigo 1º, além de outras que caracterizariam intersexofobia como nas diversas formas citadas de violência com ênfase na violência hospitalar, sem no entanto enquadrá-las expressamente como forma de racismo em seu sentido amplo. Tal omissão pode acarretar novos debates acerca da prescritibilidade ou não da intersexofobia A Lei Caó é aplicada para criminalização da homotransfobia (incluindo intersexofobia) pelo Supremo Tribunal Federal em 13 de junho de 2019 até supressão de lacuna legislativa conforme procedência da ADO 26-DF e do MI 4733-DF?
Conforme se verifica do julgamento do Mandado de Injunção nº 4733 que reconheceu a mora do Congresso Nacional para legislar sobre a criminalização da discriminação homofóbica e transfóbica, e também citando a intersexofobia, dando prazo para que o Congresso o fizesse, importa salientar que a aplicação da Lei nº 7.716/89 não resolveu de início o problema, mesmo com a procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 26, ambas julgadas no dia 13 de junho de 2019. Isso porque ambas reconheceram a aplicação da Lei nº 7.716/89, mas, por exemplo, silenciou inicialmente quanto a aplicação do artigo 140, § 3º do Código Penal Brasileiro que trata de injúria racial. Tal questão só foi consertada com o advento da Lei nº 14.532/2023 que equiparou o crime de injúria qualificada ao de racismo, aplicável aos casos de injúria homofóbica e transfóbica.
  Na ADO 28-DF temos a ampliação do conceito de racismo, para que se observe a dimensão social que a terminologia pode alcançar para se manter aplicando o entendimento da imprescritibilidade aos crimes homotransfóbicos e de intersexofobia, haja vista que deverá o legislador estar atento à necessidade de especificar com mais precisão o conceito de racismo, para inclusão de outros grupos historicamente oprimidos por meio de processos de patologização de seus corpos, de orientação sexual, identidade de gênero e características fenotípicas, muito semelhante à prática do racismo científico desenvolvido no século XIX para inferiorizar pessoas negras, judias e não-brancas em geral.
“Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a Presidência do Ministro Dias Toffoli, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer parcialmente da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Por maioria e nessa extensão, julgá-la procedente, com eficácia geral e efeito vinculante, para: a) reconhecer o estado de mora inconstitucional do Congresso Nacional na implementação da prestação legislativa destinada a cumprir o mandado de incriminação a que se referem os incisos XLI e XLII do art. 5ºda Constituição, para efeito de proteção penal aos integrantes do grupo LGBTI+; b) declarar, em consequência, a existência de omissão normativa inconstitucional do Poder Legislativo da União; c) cientificar o Congresso Nacional, para os fins e efeitos a que se refere o art. 103, § 2º,da Constituição c/c o art. 12-H, “caput”, da Lei nº 9.868/99; d) dar interpretação conforme à Constituição, em face dos mandados constitucionais de incriminação inscritos nos incisos XLI e XLII do art. 5ºda Carta Política, para enquadrar a homofobia e a transfobia, qualquer que seja a forma de sua manifestação, nos diversos tipos penais definidos na Lei nº 7.716/89, até que sobrevenha legislação autônoma, editada pelo Congresso Nacional, seja por considerar-se, nos termos deste voto, que as práticas homotransfóbicas qualificam-se como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento plenário doHC82.424/RS (casoEllwanger), na medida em que tais condutas importam em atos desegregação que inferiorizam membros integrantes do grupo LGBTI+, em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero, seja, ainda, porque tais comportamentos de homotransfobia ajustam-se ao conceito de atos de discriminação e de ofensa a direitos e liberdades fundamentais daqueles que compõem o grupo vulnerável em questão; ee) declarar que os efeitos da interpretação conforme a que se refere a alínea “d” somente se aplicarão a partir da data em que se concluir o presente julgamento, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli (Presidente), que julgavam parcialmente procedente a ação, e o Ministro Marco Aurélio, que a julgava improcedente. Em seguida, por maioria, fixaram-se as seguintes teses: 1.Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08/01/1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”);
(...)
3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito, vencido o Ministro Marco Aurélio, que não subscreveu as teses propostas. Não participaram, justificadamente, da fixação da tese os Ministros Roberto Barroso e Alexandre de Moraes. Brasília, 13 de junho de 2019. ADO 26 – DF Celso de Mello. (Grifo nosso)
  No que tange ao Mandado de Injunção 4733-DF, há inclusão das pessoas intersexo na proteção dada pela Lei Caó de forma temporária.
EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. MANDADO DE INJUNÇÃO. DEVER DO ESTADO DE CRIMINALIZAR AS CONDUTAS ATENTATÓRIAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. HOMOTRANSFOBIA. DISCRIMINAÇÃO INCONSTITUCIONAL. OMISSÃO DO CONGRESSO NACIONAL. MANDADO DE INJUNÇÃOJULGADO PROCEDENTE.1. É atentatório ao Estado Democrático de Direito qualquer tipo de discriminação, inclusive a que se fundamenta na orientação sexual das pessoas ou em sua identidade de gênero. 2. O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero e a orientação sexual.3. À luz dos tratados internacionais de que a República Federativa do Brasil é parte, dessume-se da leitura do texto da Carta de 1988 um mandado constitucional de criminalização no que pertine a toda e qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais. 4. A omissão legislativa em tipificar a discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero ofende um sentido mínimo de justiça ao sinalizar que o sofrimento e a violência dirigida a pessoa gay, lésbica, bissexual, transgênera ou intersex é tolerada, como se uma pessoa não fosse digna de viver em igualdade. A Constituição não autoriza tolerar o sofrimento que a discriminação impõe. 5. A discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, tal como qualquer forma de discriminação, é nefasta, porque retira das pessoas a justa expectativa de que tenham igual valor. 6. Mandado de injunção julgado procedente, para (i) reconhecer amora inconstitucional do Congresso Nacional e; (ii) aplicar, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei 7.716/89 a fim de estender a tipificação prevista para os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a Presidência do Ministro Dias Toffoli, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em conhecer do mandado de injunção, vencido o Ministro Marco Aurélio, que não admitia a via mandamental. Por maioria, julgou procedente o mandado de injunção para (i) reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e; (ii) aplicar, com efeitos prospectivos, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei 7.716/1989 a fim de estender a tipificação prevista para os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, nos termos do voto do Relator, vencidos, em menor extensão, os Ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli(Presidente) e o Ministro Marco Aurélio, que julgava inadequada a via mandamental. Brasília, 13 de junho de 2019. Relator Ministro EDSON FACHIN. MI 4733- DF
Portanto, mesmo tendo havido a extensão do crime de racismo, os tipos penais previstos na Lei 7.716/89 às práticas discriminatórias homotransfóbicas, há a necessidade da redação de uma legislação própria, ainda que a nova legislação possa estender, confirmando a aplicação da Lei Caó às práticas discriminatórias de intersexofobia. No entanto é da natureza do Mandado de Injunção e da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão provocar justamente o Poder Judiciário para que determine, no caso, ao Congresso Nacional para que legisle sobre matéria que tenha se omitido e que seja de natureza constitucional, como no caso. A rpovidência encontra amparo nos artigos 1º, I, 3, I e IV, 4º, II e 5º da CF/88 o direito à igualdade, dignidade da pessoa humana, a não - discriminação.
  O que deve ser observado é que durante a aplicação da Lei Caó aos crimes de discriminação por homotransfobia (incluindo a intersexofobia) que se equiparam à Lei Caó, tais práticas não são alcançáveis pela prescrição, ou seja, são imprescritíveis tais condutas.
Qualquer nova proposta legislativa que não desse nova redação à Lei Caó para incluir os crimes de intersexofobia, como os de homotransfobia, entenderia o legislador pela imprescritiblidade? No caso do Projeto de Lei nº 2.921, de 17 de julho de 2024 de autoria do Deputado Federal Clodoaldo Magalhães pelo Partido Verde – Pernambuco verifica-se que se trata de um PL que não visa alterar a Lei Caó para especificação da intersexofobia, mas uma legislação autônoma, embora possa em parte atender a expectativa de suprir a omissão legislativa que foi objeto do ADO 28-DF e MI 4733-DF, atendendo necessidades específicas das pessoas intersexos. Mas é interessante que quaisquer projetos de leis que visem sobre a questão da intersexofobia, da homofobia e transfobia coloquem as práticas criminosas como espécie do gênero racismo para que não se volte à antiga discussão já fomentada no Caso Ellwanger sobre a possível prescritibilidade da discriminação. Pode ser aproveitado para essa finalidade o conceito de racismo, na sua dimensão social como visto na decisão da ADO 28-DF, podendo se trabalhar pela extensão do conceito de racismo social. .
Por fim, observa-se uma falha na redação do Projeto de Lei nº 2.921, de 17 de julho de2024, que visa criminalizar a intersexofobia, uma omissão no artigo 2º das pena aplicável às condutas ali tipificadas, tendo se demorado mais na violência hospitalar em si, conforme os artigos 3º e 4º da proposta.

3. CONCLUSÃO
Ex Positis, infere-se que o Projeto de Lei nº 2.921, de 17 de julho de 2024 de autoria do Deputado Federal Clodoaldo Magalhães pelo Partido Verde – Pernambuco não fere a nenhum dispositivo constitucional, estando em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana e atendendo sobretudo ao direito congênito à autodeterminação de gênero.
Quanto à questão doutrinária, o presente parecer coloca como sugestão a inclusão expressa no Projeto de Lei, em análise, das práticas caracterizadas como intersexofobia como espécie do gênero racismo para que os crimes praticados não sejam alcançados pela prescrição, sendo os agentes beneficiados pela extinção da punibilidade sem antes responderem por suas práticas que violam o direito de exisitir plenamente das pessoas intersexo em conformidade com a própria autodeterminação de gênero, buscando uma melhor caracterização do conceito de racismo social.
Requer ainda a correção da redação do Projeto de Lei para redigir pena aplicável às condutas tipificadas em seu artigo 2º, tendo sido omisso sem querer, o legislador proponente.
Infere-se pela recepção da Indicação nº 23/2024, sendo favorável ao Projeto de Lei nº 2.921, de 17 de julho de 2024, por suprir no que tange às pessoas intersexuais a omissão legislativa já verificada na análise da ADO 26-DF e MI 4733-DF, devendo ser remetido este documento, após aprovação pela Comissão de Direito Constitucional e pela sessão plenária da Casa de Montezuma ao Gabinete do Deputado Federal Clodoaldo Magalhães do Partido Verde – Pernambuco, bem como aos integrantes da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados Federais (CSAÚDE) para fins de conhecimento e sugestão das medidas que podem ser adotadas. Também recomenda que este parecer seja encaminhado para a Associação Brasileira de Intersexos.
É o parecer, salvo melhor juízo.
João Pessoa, 25 de março de 2025
Laura Taddei Alves Pereira Pinto Berquó
Membro Efetivo – OAB/PB 11.151

sexta-feira, 27 de junho de 2025

O DIREITO CONGÊNITO DOS POTIGUARA À PRÓPRIA TERRA



Na segunda-feira, 09.06.2025, o trânsito da BR 101 foi interrompido no litoral norte paraibano, na altura do KM24, tendo como protagonistas os Potiguara e os Tabajara, organizados pela Mobilização Nacional dos Povos Indígenas no Brasil em protesto, segundo o Jornal A União[1], ao PDL nº nº 717/2024, de autoria do Senador Espiridião Amin (PP-SC) que segundo a ementa pretende sustar “o art. 2º do Decreto nº 1.775, de 8 de janeiro de 1996, que dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras providências, o Decreto nº 12.289, de 4 de dezembro de 2024, que homologa a demarcação administrativa da terra indígena Toldo Imbu, localizada no Município de Abelardo Luz, Estado de Santa Catarina, e o Decreto nº 12.290, de 4 de dezembro de 2024, que homologa a demarcação administrativa da terra indígena Morro dos Cavalos, localizada no Município de Palhoça, Estado de Santa Catarina.”

Ocorre que existem pelo menos dois Projetos de Decretos Legislativos para “desmarcar” o território Potiguara. Assim, o Projeto de Decreto Legislativo nº 544/2024 de autoria da Deputada Federal Caroline de Toni (PL-SC) dispõe que pretende sustar “os efeitos dos Decretos nº 12.288, nº 12.289 e nº 12.290 de 4 de dezembro de 2024, que dispõem sobre a homologação da demarcação das Terras Indígenas Potiguara de Monte-Mor, na Paraíba, Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, em Santa Catarina.” Nesse mesmo diapasão segue o PDL nº 520/2024, de autoria da Deputada Federal Daniela Reinehr (PL-SC) que também pretende sustar “os efeitos dos Decretos números 12.288, 12.290 e 12.289 de 04 de dezembro de 2024, que dispõe sobre a demarcação das Terras Indígenas Potiguara de Monte-Mor, na Paraíba, Morro dos Cavalos e Toldo Imbu, em Santa Catarina.” O Decreto (presidencial) que diz respeito às terras paraibanas dos Potiguara é o de nº 12.888, de 04 de dezembro de 2024, que assim dispõe:

“Homologa a demarcação administrativa da terra indígena Potiguara de Monte-Mor, localizada nos Municípios de Rio Tinto e de Marcação, Estado da Paraíba.

     O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 19, § 1º, da Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, e no art. 5º do Decreto nº 1.775, de 8 de janeiro de 1996,

DECRETA:

     Art. 1º Fica homologada a demarcação administrativa, promovida pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas - Funai, da terra indígena denominada Potiguara de Monte- Mor, localizada nos Municípios de Rio Tinto e de Marcação, Estado da Paraíba, destinada à posse permanente do grupo indígena Potiguara, com superfície de sete mil quinhentos e trinta hectares cinquenta e nove ares e sessenta e nove centiares e perímetro de cinquenta e sete mil novecentos e setenta metros e sessenta e três centímetros, a seguir descrita.”

Parlamentares que desconhecem história da Paraíba e as áreas habitadas pelos Potiguara, pretendem sustar ato do Poder Executivo que trata da demarcação das terras dos povos originários paraibanos. Parlamentares que pelo visto desconhecem a história dos povos originários de todo país e pretendem sustar todos os atos do Poder Executivo a respeito. Mas o território Potiguara é rico em titânio. Nenhuma demarcação é realizada sem um prévio estudo antropológico. Além da falta de conhecimento e da "cultura" desses povos, da forma de autodeterminação e pertencimento, desconhecem, embora não pudessem, a Teoria do Indigenato. A maltratada Teoria do Indigenato que já foi desrespeitada inclusive pela gestão do PT.

 O discurso de Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU em fins de setembro de 2019 está de acordo com a política eugenista contra nossos indígenas. Nenhum "índio" terá mais um palmo de terra e não estamos somente falando do fim da Teoria do Indigenato ou do Fato Indígena ou de Marco Temporal, mas por trás do discurso meramente assimilacionista, em se apresentar uma mulher indígena fenotipicamente aceitável como indígena (Kalapalo), estamos nos referindo a uma profunda ignorância e falta de respeito à autodeterminação dos povos originários que não se baseia em características estritamente fenotípicas e estereotipadas.

O pertencimento a cada etnia fica a critério da autodeterminação de cada povo. Porém, essa política infame não começa com Bolsonaro. Com a política desenvolvimentista do Governo Dilma e o interesse de latifundiários em terras originalmente indígenas, passou a se adotar como política de governo somente a Teoria do Fato Indígena, conforme se verifica na Portaria AGU n.º 303, de 16 de julho de 2012, após décadas de políticas assimilacionistas incentivadas pelo Estado brasileiro, com “vista grossa” para as violações de direitos desses povos pelo capital do latifúndio. Há também o interesse no apagamento do protagonismo dos movimentos sociais indígenas na luta pela reconquista de seus territórios como extensão de um direito da personalidade desses povos, que poderão continuar com sua identidade étnica e cultural.

Os Potiguara estão situados no mesmo lugar desde a chegada dos colonizadores há 525 anos. A bibliografia e os documentos sobre a história do atual Estado da Paraíba evidenciam, desde o descobrimento do Brasil, a presença dos Potiguara no litoral paraibano e, mais notadamente, na Baía da Traição. (CARDOSO et alli: 2012, p. 15)[2]. De acordo com Rodrigo Siqueira Ferreira (2014, p. 89), a UNI coordenou a coleta de assinaturas em todo o país, que resultou na Proposta de Emenda Popular n.º 40, que sofreu forte oposição de grupos de latifundiários, representantes de multinacionais na Constituinte, com o argumento de que o reconhecimento da autodeterminação, a partir do conceito de nação e de direitos territoriais dos povos indígenas, fere a soberania nacional.

Por fim, foi parcialmente recepcionada a Proposta de Emenda Popular n.º 40, que resultou nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal. Importante frisar que Rodrigo Siqueira Ferreira (2014, p. 88)[3] cita os Potiguara como participantes dos debates do Congresso Nacional, ao longo dos 22 meses em que durou a Constituinte. O discurso entre as diversas nações indígenas foi unificado e contou com o protagonismo da União das Nações Indígenas, fundada em 1980, segundo Ferreira. Os Potiguara trazem a resistência de sua ancestralidade que por muito tempo assombrou os portugueses e com certeza juntamente com outras lideranças comprometidas com a Teoria do Indigenato, não irão aceitar essa nova tentativa de esbulho de suas terras.

Laura Berquó

Advogada. Professora Adjunta da UFPB. Mestre em Ciências Jurídicas pela UFPB. Ex-Conselheira Estadual de Direitos Humanos – Paraíba. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros –IAB.

Fontes:

1. CARDOSO, Thiago Mota; GUIMARÃES, Gabriella Casimiro (Orgs.). Etnomapeamento dos Potiguara da Paraíba. Brasília: FUNAI/CGMT/CGETNO/CGGAM, 2012 (Série Experiências Indígenas, n. 2).

2. FERREIRA, Rodrigo Siqueira. Vinte e cinco anos de cidadania e direitos constitucionais. O Movimento Indígena da luta por autodeterminação na Constituinte (1987/88) ao embate político no Congresso Nacional contra as tentativas de redução dos direitos originários sobre as terras. In: Mari yé bó eshé. Organizadores: Frank Coe, Joe Marçal, Wilma Mendonça e Álvaro Tukano. 2 ed. Karioka, Porto Alegre, 2014.

3. PARAÍBA. A UNIÃO. https://www.auniao.pb.gov.br/noticias/caderno_paraiba/povos-protestam-por-demarcacoes. Acessado em 11.06.2025


A BRANQUITUDE ADULTOCÊNTRICA DA EXTREMA-DIREITA



As contradições da extrema-direita no Brasil são para garantir o ódio às minorias. Os projetos de leis recentes que visam proteger o racismo recreativo são justificados pela branquitude. A supremacia branca como projeto, tendo como carro-chefe Santa Catarina e o Rio como reduto bolsonarista, justifica não ver nada demais em injúrias raciais coletivas, capacitistas, misóginas, etc. Até aí estão coerentes com o desrespeito às minorias. Mas falam tanto contra "ideologia de gênero", "sexualização de crianças" e fazem Projetos de Leis para defender humorista que faz piada sobre pedofilia. São contraditórios, porque é da conveniência política deles. No site do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania temos a seguinte chamada:

"Disque 100 registra mais de 17,5 mil violações sexuais contra crianças e adolescentes nos quatro primeiros meses de 2023. Aumento é de 68% em relação ao mesmo período do ano passado, há maior participação da sociedade na mobilização e denúncia. A casa da vítima, do suspeito ou de familiares é o pior cenário, com quase 14 mil violações"

Normalizaram ou fingiram que não viram as piadas de pedofilia, para terem "autorização" para falarem mal de negros e demais minorias. As mulheres brancas burguesas, ou que pensam como tal, acharam normal um comediante dizer que feminista boa é feminista morta, mesmo com os altos índices de feminicídio no Brasil. Afinal, a mulheridade branca burguesa não faz parte dos 99%. Para naturalizar esse tipo de aberração temos dois Projetos de Leis que nasceram do episódio Léo Lins: PL n° 2725 /2025, que revoga dispositivos da Lei Caó de autoria da Deputada Federal Caroline de Toni (PL - SC) e o PL n° 2730/2025 que pretende instituir a Lei Léo Lins de autoria do Deputado Federal Roberto Monteiro (PL- RJ). Querem liberar o racismo recreativo para que possam contar piadas e reafirmar pela jocosidade que bom mesmo é ser branco, sem deficiência e pode até ser mulher, desde que não seja feminista. Uma grande concessão à existência das mulheres. E as crianças no mundo adultocêntrico nem existem, nem têm "lugar de fala". Elas só aparecem quando chegam notícias dos casos de violências extremas. Uma coisa que pontuo é que há uma questão no mundo branco adultocêntrico burguês que não é verbalizado, mas ensinado em lares brancos: "o que se passa em casa, fica em casa". E isso inclui as violências, silenciando para se manter o bom nome do "clã". Enquanto crianças negras são vítimas do mundo adutocêntrico independente de terem lares disfuncionais ou não, a violência contra as crianças brancas é da porta para dentro, até aparecerem Henrys, Isabelas e Leandros. Então, surge a comoção como se a branquitude não soubesse o que se passa em lares disfuncionais, porque o racismo quer passar a ideia que só lares negros são disfuncionais. Não é estranho que a extrema-direita feche os olhos para piadas de pedofilia para poderem voltar a ofender negros. Faz parte da hipocrisia dos lares brancos.

Para concluir, o que vemos e não sabemos se é má-fé ou ignorância projetos de leis que restauram o racismo no Brasil, ainda que para fins recreativos (racismo indireto por meio do humor), uma vez que há inconstitucionalidade também em conformidade com o artigo 16 da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância , incorporada ao ordenamento jurídico pátrio com status de emenda constitucional que coíbe leis que agravam a situação do racismo.

Laura Berquó

Advogada e Professora Adjunta da UFPB – Campus IV – Litoral Norte. Mestre em Ciências Jurídicas pela UFPB. Membro efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB. Ex-Conselheira Estadual de Direitos Humanos - Paraíba


ESTAMOS DE VOLTA



Ola Pessoas Queridas! Este print é de hoje de manhã e mostra o número de visualizações no meu blog epahey2015.blogspot.com , com sua primeira publicação em 11.06.2015 e última em 05.04.2020. Mesmo sem estar publicando desde o início da pandemia, meu blog continua sendo acessado. Esse mês foram 1481 acessos e desde a sua criação, com 05 anos de atividade e 05 anos de repouso, ultrapassamos meio milhão de visualizações. O Blog surgiu da necessidade de dar publicidade ãs denuncias que recebi e estive à frente quando Conselheira Estadual de Direitos Humanos na Paraíba (2012-2015), para assim evitar que me matassem (o que não impediu processos, que tiveram início ainda antes da criação do Blog em 2013, quando denunciei torturas de presas no presídio feminino de João Pessoa). Epa Hey!  É a saudação de minha Mãe Iansã que espanta a morte. Ela não engana a morte como Ewá! Ela afasta! E com fé na minha energia de mulher imprevisível consegui chegar aqui. Retornarei com o blog a partir de agora, porque diferente do que pretende o sistema, não irei me calar com os casos de torturas na Penitenciária Feminina Maria Júlia Maranhão. O meu blog foi voz e espaço para diversos casos sepultados pela força da caneta ou que não andam: Bruno Ernesto, Sebastian (mandantes), explosões de bancos, racismo, morte de crianças, violência contra mulheres, intolerância, etc.  O que acontece na Paraíba não ganha as páginas nacionais. Mas nós existimos, com nossos unicórnios azuis contemplando muitas vezes a orfandade diante dos poderes. Na audiência de instrução do processo movido contra mim sobre as denúncias de torturas pela Diretora do presídio feminino, eu disse ao Magistrado que, mesmo condenada, não iria deixar de dizer o que ocorreu naquele ergástulo. O @govparaiba é conivente ao manter o mesmo quadro da gestão anterior. Presas não possuem credibilidade e nem eu,  com o etiquetamentos da Justiça. Qual o deputado que manda na pasta da SEAP? Porque sim Há inclusive político homem ditando regras para feministas. O fato é que vamos procurar outras vias para que se faça jusriça à Adriana de Paiva Rodrigues e ao que se passa aqui. 

Laura Berquó